Mostrando postagens com marcador criatividade. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador criatividade. Mostrar todas as postagens

domingo, 3 de abril de 2011

Nunca é suficiente relembrar alguns pontos

Às vezes, olhando de forma muito pragmática, a venda de uma ideia por meio do discurso de outros - principalmente citações - pode soar uma saída preguiçosa e pouco original.

Já no meio acadêmico, os rigores da metodologia científica correm exatamente para o outro lado, e - com uma provável honrosa exceção de Umberto Eco - ninguém constrói um raciocínio sem alicerçar sua argumentação nas falas de muitos outros que vieram antes.

Extremos à parte, você pode querer assegurar uma pureza de discurso (que na verdade não existe, mas isso é conversa para outro post) ou "sustentar-se nos ombros dos gigantes", mas não dá para negar que uma boa parcela da credibilidade do que dizemos se alimenta da credibilidade da fonte, e não do conteúdo. Seja ela você mesmo ou o já citado Umberto Eco.

A intencionalidade presumida que acreditamos ver no discurso do outro, por exemplo, afeta diretamente o crédito que damos à sua fala. Basta uma mínima desconfiança de que a argumentação tem motivações alheias para já criar uma barreira de ceticismo. Experiência, por exemplo, que toda mãe já viveu ("quando é a mãe que fala, filho nunca escuta!").

Se mães já ficam sem credibilidade, e professores, então? "Quem sabe faz, quem não sabe ensina, quem não sabe ensinar dá aulas de educação física", brinca Jack Black em "Escola do Rock". Piadas à parte (sem ressentimentos, pessoal da educação física! :) professores com frequência passam pela mesma situação. São horas falando sobre caminhos possíveis e caminhos problemáticos, sobre onde ficam os gargalos do processo, e ainda assim, ao final, lá estão todos os problemas espalhados pelos trabalhos finais. Mas basta uma palestra num evento de publicidade, e de repente tudo aquilo que foi dito passa a fazer sentido para o aluno, que ocasionalmente vem contar como em uma hora de palestra ele aprendeu mais coisas sensacionais que em um semestre de aula. O que seria genial, não fosse o fato dessas coisas sensacionais terem sido todas exploradas em sala.

(ei, claro que outros fatores influenciam. Foco, cansaço, predisposição, metodologias melhores ou piores. E a perspectiva de uma coisa nova fora de sala de aula sempre atiça mais a curiosidade. Mas um professor não se furta a fazer um pequeno drama, de vez em quando :)

Por isso às vezes é interessante cortar intermediários e trazer você mesmo para o ambiente acadêmico as falas dos gigantes da área. Uma citação com um nome de peso de alguém inserido no mercado faz horrores pela credibilidade de uma mensagem. Foi nesse espírito que esbarrei numa entrevista antiga com o Roberto Duailibi, em que ele fala sobre processo criativo. Destaco um trecho em especial:

"Eu tenho método. Por exemplo, eu nunca escrevi um título sem que eu escrevesse pelo menos quarenta títulos. Eu acredito que a quantidade de ideias gera qualidade. Então, a primeira condição é não ter preguiça. É você sentar em frente ao teclado e escrever, escrever, escrever... nunca ficar satisfeito com uma solução até encontrar aquela frase que seja realmente circular; que penetre, que diga tudo aquilo que você quer dizer com poucas palavras."

Adorei ouvir aquelas palavras, porque elas reproduzem exatamente algo que é falado em sala de aula quase todos os dias. Por isso trago para cá a frase e o link para a tal entrevista, torcendo para que uma mãozinha de um dos melhores redatores publicitários do Brasil ajude a convencer os alunos daquela velha máxima sobre "1% de inspiração, 99% de transpiração".

O processo criativo, por Roberto Duailibi - DPZ- parte 01

O processo criativo, por Roberto Duailibi - DPZ- parte 02

O processo criativo, por Roberto Duailibi - DPZ- parte 03

O processo criativo, por Roberto Duailibi - DPZ- parte 04

-----
Ainda sobre a história das mães: um conhecido, após discutir por horas com sua mãe sobre um determinado (e polêmico) ponto de vista, ouviu dela o argumento final: "tudo bem. Não me dê ouvidos. Mas você vai passar por isso também. Eu desejo somente que seu filho seja um filho exatamente igual ao que você foi". Ao que ele, numa epifania de percepção sobre si mesmo, respondeu enfaticamente: "poxa, mãe, agora você pegou pesado..."

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Conceitos, bois e bananeiras


O fato é verídico e aconteceu com um grande amigo meu, designer, numa rodoviária da vida. Um fazendeiro muito simpático sentou-se ao seu lado e logo puxou assunto sobre o tempo, a demora do ônibus e outras amenidades. Não demorou a surgir os assuntos de trabalho. “E aí, meu fio. O que ocê faiz da vida?” “Mexo com criação” – respondeu laconicamente. “E ocê cria o quê?” “Eu crio conceitos, logomarcas, latas, adesivos...” “Gozado criá lata... eu vivo é de criá boi.”

Depois disso, quase toda vez que eu estou criando algum conceito, peça ou campanha, me vem a imagem de um bando de holandesas pastando candidamente. Quer uma coisa mais palpável do que uma vaca? Arrobas e mais arrobas de presença física, chifres, leite todas as manhãs, um churrasco no fim da vida. Criar bois prescinde de informações adicionais. Mas nós criamos CONCEITOS. Quer algo mais intangível que isso? Conceitos também nascem, crescem, se reproduzem e... olha que legal! Os bons nunca envelhecem ou morrem! Não é uma Brastemp, tem coisas que o dinheiro não compra, mil e uma utilidades... Como fazer as pessoas que não são “do mundinho” entender isso? Só existe um jeito. Criando conceitos realmente memoráveis, que aumentem as vendas e se tornem eternos. Segundo CAMARGO (2004), conceito criativo nada mais é que uma forma original e inovadora que procura fixar na mente do público-alvo uma afirmação desejada. Captaram? É preciso fixar-se na mente do Sr. Target, não como aquelas canções grudentas que provocam alterações de humor (não vou citar nenhuma pra você não acordar com ela na cabeça amanhã e me detonar no twitter). Sempre me enterneço com a simplicidade e a genialidade de Bastos Tigre para a Bayer, num slogan que existe desde 1922. “SE É BAYER, É BOM.” Sonoro, forte, fácil de fixar. Fácil? Imagino sempre uma senhora na gôndola da farmácia comprando sua aspirina. Se é Bayer é bom.

Qual o segredo então? Treino, treino, treino. Simplificar ideias complexas. Vestir o corpo e encarnar o espírito do público em questão. Como ele fala, como ele se veste, onde ele vai? Depois brincar com as formas, as sintaxes, os materiais. Cruzar o estudo minucioso com as ideias mirabolantes e “emprenhar-se” de algumas soluções possíveis.

O resultado só o tempo e o feedback das pessoas ( e dos gráficos de venda) nos trará. Talvez sim, seremos capazes de gerar boas memórias. Talvez não, melhor criar bois, vacas, galinhas, plantar milho ou bananeira. Vale criar de tudo. Menos abobrinha.

----------
Nívea Braga é a mais nova colaboradora do Criação-Fu!

segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Processo criativo: dois livres diagramas

Estes dois diagramas foram criados para ajudar a explicar o processo criativo, e utilizados como suporte às aulas de Criatividade e Inovação.

São uma livre interpretação do processo - que também é definido como tendo 4, 5, 7 ou até 10 fases - e como tudo mais que envolve heurísticas, estão mais para mapas exploratórios que para um guia definitivo.

A ideia é mostrar alguns dos conceitos-chave e enfatizar os aspectos racionais ou abstratos predominantes em cada fase, além de suscitar alguma reflexão sobre o processo.

Quanta informação você consegue tirar desses diagramas?

segunda-feira, 6 de setembro de 2010

Sobre a jurássica arte de "fazer à mão": um adendo

Em tempo: recomendo a todos esse vídeo do John Cleese (Monty Python) sobre criatividade. Ia entrar no post anterior, mas acabei esquecendo de incluir.


Sobre a jurássica arte de "fazer à mão"

Ensinar é um processo complicado que exige uma boa dose de mente aberta de ambos os lados - professor e aluno. Muitas vezes, transmitir uma determinada mensagem com eficiência tem mais a ver com encontrar o jeito certo de dizer do que com o que é dito, especificamente.

Gosto de coletar frases de pessoas que já trabalham com criação há mais tempo que eu - ou, para ser dolorosamente sincero, com mais eficiência nisso, ao menos. Não sei se é simplesmente uma questão de legitimação ou de acerto na escolha das palavras. Mas Umberto Eco já dizia que escrevemos livros sobre outros livros que já lemos. Sendo assim, não raro acabamos atingindo esse objetivo pelas palavras de outros.

Dia desses, um aluno comentou comigo que os dias de roughs feitos à mão estavam contados graças aos computadores. Essa questão vez ou outra acaba vindo à tona quando estou conversando sobre processos na criação - o uso da tecnologia, e em que parte desses processos ela se aplica melhor.

Há muitas concepções que nunca foram discutidas anteriormente por falta de necessidade. Um exemplo típico é a experiência de certos processos mecânicos/braçais na publicidade. Fiquei pensando no que ele havia dito e em por que não concordava, quando me lembrei de algo que li no site do Von Glitschka (criador do www.illustrationclass.com): "Our industry may be digitally driven but ideas are still best developed in analog form."

Vejam bem... Não tenho a intenção de ser nostálgico ou retrógrado. Apenas quero propor uma reflexão acerca de coisas sobre as quais às vezes não paramos para pensar.

Eu me formei em publicidade nos anos 90. Peguei a transição dos métodos antigos de composição e arte-finalização para aqueles usando sistemas informatizados. Quando entrei na faculdade, etapas como concepção, layout e arte-final eram bem distintas, em parte por uma razão técnica: como compor textos era caro e trabalhoso, não dava para se dar ao luxo de finalizar uma ideia antes de ter certeza de que ela era boa o suficiente para ser aprovada.

Por isso era necessário planejar bem uma ideia - rascunhá-la, depois criar um layout com marcadores e imagens genéricas ou ilustrações, deixando para compor somente quando a deia estava bem definida. A popularização de programas de edição de imagem e composição fez surgir a figura do "lay-arte" - um layout que já usa composição eletrônica de tipos, e muitas vezes a imagem final do anúncio.

(Nesse momento essa conversa deve estar parecendo jurássica para quem - como alguns de meus alunos - *nasceu* nos anos 90. Mas peço que tenham paciência e prossiga para que eu termine de expôr meu ponto de vista.)

Essa facilidade tecnicamente mostrou a obsolescência das etapas anteriores. Não há por que fazer um rascunho á mão se eu posso ter uma ideia muito mais próxima da realidade já na etapa inicial, correto?

Mas será que é isso mesmo?

Parece-me que na velocidade da transição, faltou, em algum momento, um questionamento sobre a verdadeira importância desses procedimentos. Faltou entender, por exemplo, qual o papel do rascunho no processo de criação. Em como o trabalho à mão livre tem mais fluidez e é menos engessado que o feito diretamente no computador, ou como dá margem ao erro, que pode ser um interessante elemento de retroalimentação no processo de criar.

Além do mais, rascunhar permite planejar. E planejamento significa, na pior das hipóteses, menos retrabalho. Trabalhar sem algum planejamento é pular etapas. E pular etapas quase sempre leva a ideias rasa, "primeiras ideias" - aquelas às quais qualquer pessoa conseguiria chegar, mas que não conseguem ter impacto ou retenção suficiente.

Quem desenha sabe como um traço que não saiu como o esperado acabou por sugerir um caminho mais interessante que o imaginado inicialmente - possibilidade que o computador, com seus processos cartesianos, elimina quase por completo (faço questão de destacar o "quase" porque eu mesmo já tive uma experiência de erro provocada pelo computador que me sugeriu uma ideias melhor - mas deixo essa discussão para outro momento). E vendo o trabalho de diversos artistas e designers que trabalham com propaganda - entre eles o próprio Von Glitschka - acho que não devo estar tão equivocado assim.

Há uma situação análoga quando se fala de texto. Lembro-me de discutir uma vez sobre a importância da leitura, e de como isso seria modificado se tivéssemos na vida real meios de adquirir conhecimento como os mostrados no filme "Matrix" - plug & learn. Ainda acho que o maior mérito da leitura não seja a transmissão do conhecimento em si, mas o exercício do pensar. Ler nos ensina a raciocina, a concatenar ideias, a estruturar pensamentos. Reduzir a leitura a um simples processo de aquisição de informação é enveredar por um caminho que pode embotar nossas ideias se o futuro os reservar métodos mais eficazes e menos "jurássicos" do que ler um texto.

Para quem não acredita nisso, proponho o desafio de sair um pouco da frente do computador. Pegue lápis e borracha, e experimente criar de forma mais livre. Seja menos assertivo e mais experimental. Você pode acabar descobrindo que Dave McKean, Picasso, Bill Sienkiewicz, Nick Bantok e tantos outros não fizeram o mesmo à toa.

"Practice safe design - always use a concept."
"You can never have too many ideas."
"When in doubt, re-draw it."
- Von Glitschka

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

O tempo das coisas

"Se a lâmpada acender em cima da sua cabeça rapidinho, ótimo. Mas e se não acender? Qual é o tempo máximo para se desistir de uma boa ideia em favor da “responsabilidade” de se fechar o pedido e cumprir com um prazo?"

Excelente o post de Wagner Brenner para o Update Or Die. 100% pertinente à rotina de quem trabalha com criação publicitária.

Veja o post completo aqui.

sexta-feira, 9 de julho de 2010

terça-feira, 21 de abril de 2009

10 erros fáceis ao criar para publicidade


O texto a seguir foi adaptado a partir do post "10 Mistakes Logo Designers Can Make When Designing Logos". A despeito do foco espefício do texto original, as dicas caem como uma luva para o processo de criação publicitária.
  1. Iniciar o processo de criação sem um objetivo. Invista um bom tempo esmiuçando o brief, converse com o cliente se possível, e procure saber o máximo que puder sobre o público, a concorrência e os objetivos do cliente e do produto ou serviço.
  2. Criar "no vácuo". Conheça a concorrência e o cenário no qual o produto ou serviço estão. E não se limite a ler o brief: uma pesquisa por conta própria pode dar boas pistas. Isso proporcionará idéias menos genéricas e soluções mais consistentes.
  3. Não ser capaz de responder à pergunta "mas... por que?" Embora os processos de geração de idéias sejam essencialmente espontâneos, é preciso que as decisões tomadas tenham alguma base. É muito fácil ter uma peça reprovada pelo cliente quando as justificativa parecem esbarrar no gosto pessoal. E a propósito: "porque Deus quis" não é um argumento sólido.
  4. Ir para o computador cedo demais. Computadores são ótimos para fazer exatamente o que você manda que façam - e isso é ruim para a criação, que se alimenta também do erro, do traço livre e da casualidade. Além do mais, como o computador torna fácil alterar o trabalho, a tentação de entrar num loop de tentativa-e-erro é grande, fazendo com que o processo vire uma grande experimentação aleatória sem propósito.
  5. Deixar de escutar uma opinião com base em quem a deu. Engula o ego e escute. Pode-se. aprender muito com as fontes mais inesperadas.
  6. Escolher mal a tipografia e os recursos gráficos. Essencialmente, não sexiste não-intencionalidade numa peça publicitária. Pense non resultado que uma escolha de fonte ou imagem poderá causar. Ela quer dizer algo quer você não tinha em mente que dissesse? A melhor opção é uma foto ou uma ilustração? Qual o impacto da escolha da fonte? Pense globalmente.
  7. Desconsiderar as aplicações da peça. O método de produção, o tipo de mídia, o ponto de exposição - tudop isso influi no modo como a peça será eprcebida. Criar para um cartaz de corredor de universidade não é como criar para um anúncio de revista, uma epmena, uma CEMUSA ou um adesivo. É preciso pensar em como o público será "pego" pela peça.
  8. Usar macetinhos ou recursos prontos de softwares. No princípio era o page curl. E o diretor e arte viu que era bom (mentira), e se regozijou. E veio o drop shadow. E o glow. E os bevels. E há pouco tempo, os brushes. Esses recursos todos costumam soar falsos e batidos, e poucas vezes são usados como solução real, e não coom "recurso que estava lá praticamente pedindo para ser usado". Lembre-se da oração da Serenidade: ter forças para fazer o que deve ser feito, resignação para aceitar o que não pode ser mudado, e nunca, nunca, nunca, nunca, nuca mais usar efeitinhos prontos gratuitamente.
  9. Mostrar opções demais para o cliente. Além de agilizar o processo de seleção, evita passar ao cliente a idéia de que você mesmo não tem muita certeza quanto a qual caminho seguir. Também reduz a probabilidade de surgirem as peças Frankenstein, nas quais o cliente pede "o título dessa com a imagem daquela, o texto de apoio daquela outra, com as cores da primeira e a tipografia da última".
  10. Mostrar para o cliente opções que você não quer que ele escolha. Há uma história envolvendo o arquiteto americano Frank Lloyd Wright e um jardim de inverno que teria sido colocado em um projeto apenas para que o cliente o cortasse, achando assim que havia participado da idéia. Isso pode ser um recurso interessante, mas também pode ser um senhor tiro-no-pé. Para que correr o risco? Se não quer que ele escolha, não mostre a ele.

quarta-feira, 17 de setembro de 2008

(des)aforismos (parte II)

"Se você por acaso pertencer à minoria mal-humorada que pode realizar um trabalho criativo, nunca force uma idéia; você a abortará se fizer isso. Seja paciente e dará à luz a ela quando chegar o momento. Aprenda a esperar."
(Lazarus Long)

Quando comecei o post anterior (e antes de ele virar um texto em duas partes) minha intenção era falar sobre uma boa descoberta que eu havia feito. No meio do caminho, no entanto, ficou claro para mim que era preciso abordar outras coisas antes de falar sobre o que tinha me motivado inicialmente, para dar contexto. Criação tem disso. Às vezes as coisas não saem como planejamos, e isso é algo bom, na verdade, porque nos tira da mesmice e nos proporciona vislumbrar outros caminhos.

Sou um fã do acaso, para ser bem sincero. Às vezes é difícil para quem já trabalha com algo a tempo demais desviar-se conscientemente só pela experiência de conhecer coisas novas. Às vezes busco modos de fazer isso, aproveitando pequenas oportunidades – como entrar num corredor qualquer de uma biblioteca e selecionar um livro só pelo nome ou pela capa (coisa que fiz recentemente, inclusive).

Outras vezes, “as coisas” se encarregam de fazer isso. Certa vez estava numa livraria-café matando tempo (literalmente) quando um funcionário espanando uma das estantes fez um livro cair entre meus pés, com o título virado para mim. Era um livro sobre usabilidade, ergonomia e arquitetura de informação – exatamente o tema de um TCC que eu estava orientando na época. Oportunidades como esta não se desperdiça.

Em outra ocasião, eu estava no aeroporto aguardando uma pessoa que chegaria dentro de hora e meia. Como sempre faço, fui até a livraria ver o que havia de novo, e esbarrei nesse livro do James Geary, O Mundo Em Uma Frase - Uma Breve História do Aforismo.

Interlúdio: segundo o dicionário online Priberam, Aforismo (do Lat. aphorismu - Gr. aphorismós, delimitação s. m.) é definido como ”proposição, máxima, rifão ou sentença que em poucas palavras encerra um princípio moral.”

Retomando. Achei o título interessante e resolvi comprar para ter algo para ler durante a espera. Em um dado momento, o autor começa a relacionar o que ele chama de “as cinco leis do aforismo”. Fui lendo aquilo, e comecei a perceber que suas definições de um bom aforismo se enquadravam exatamente na descrição do que um bom título publicitário deve ter (mérito do bom e velho backburn - é o que acontece quando você mantém perguntas em sua mente em busca de respostas que possam atendê-las).

Basicamente o que vi ali foi a resposta a um constante problema de explicar como se cria bons títulos. Resolvi então adaptar essas leis do aforismo para um contexto publicitário, e o resultado foi esse:

Cinco caracterísiticas de um bom título publicitário (análogas às cinco leis do aforismo):

  1. Concisão - independentemente de um título ser longo ou curto (i.e. ter muitas ou poucas palavras) ele precisa ser conciso - ou seja, concentrar informação que possa ser percebida como uma unidade. O texto deve fluir. Se ao ler a frase têm-se a impressão de que "está demorando", pode haver ruído. Olgivy disse que "não há títulos longos ou curtos, mas títulos bem, ou mal construídos".
  2. Conteúdo preciso - um bom título precisa dizer algo, ou ficará vazio. Sua função é trazer a atenção do leitor para o anúncio; se ele não diz nada de relevante, interessante ou informativo, significa que não atendeu ao seu objetivo.
  3. Idiossincrasia - um título não pode se dar ao luxo de ser neutro demais, ou não cativará. è rpeciso que ele tenha certa personalidade, já que de um modo ou de outro, representa um ponto de vista sobre alguma coisa.
  4. Guinada - um texto publicitário que não surpreende em algum nível é como uma piada sem o "chiste". É preciso que ele surpreenda, quebre uma expectativa ou faça a pessoa ver alfgo que não tinha percebido. Ou como diria Mika, é preciso ter um "ca-tchiiing" :)
  5. Profundidade filosófica - você não precisa citar Platão ou Nietzsche, mas é interessante que após ler o anúncio o leitor fique com aquilo na cabeça, aquela sensação de "ei, é mesmo...." que a guinada deixa.
Não é uma receita de bolo (ainda bem), mas fiquei satisfeito com a analogia, porque vejo nela uma possibilidade de entendimento sobre a essência do que é fazer um bom título.

Complementando, há ainda sugestões de leitura que sempre ajudam a quem quer aprender um pouco mais siobre o ofício de moldar palavras em textos:

  • "Razões para se bater num sujeito de óculos", do Eugênio Mohallen
  • "Razão e sensibilidade no texto publicitário", do João Anzanello Carrascoza
  • "Os Piores Textos de Washington Olivetto", do próprio
  • "Redação publicitária", do João Anzanello Carrascoza
  • "Redação publicitária: sedução pela palavras", do Celso Figueiredo
  • "Cultura de verniz 2", do Roberto Menna Barreto
... e este humilde blog sobre criação publicitária que vos fala :)

Bem, a mensagem basicamente é essa. O pontapé inicial está dado. Agora é escrever, escrever e escrever!

quarta-feira, 3 de setembro de 2008

(des) aforismos (parte I)

A tarefa de ensinar em publicidade pode ser (e geralmente é) espinhosa, porque transita no limiar acadêmico de uma atividade cuja prática costuma ser extremamente pragmática. Com tantos criativos sem formação acadêmica atuando com sucesso no mercado publicitário brasileiro, às vezes pode parecer pretensioso tentar impor regras e métodos para criar.

Particularmente acho que essa percepção sobre “talentos naturais” um tanto enganosa – o fato de alguém ter maior facilidade para determinados processos mentais (como aqueles envolvidos no processo de criação) não elimina a existência de um método; no máximo, indica que ele é intuitivo, e portanto não percebido como tal.

E não podemos ignorar que essas discussões acontecem dentro do universo acadêmico - e a academia é a casa das teorias e abstrações. Logo, no processo de ensinar a criar não há como fugir completamente do arcabouço teórico. Para encontrar um ponto de equilíbrio entre a verve empirista e o método acadêmico, é preciso buscar pontos de contato entre esses dois universos (o que, aliás, é um recurso básico de retórica).

A gestação deste blog ocorreu dentro da matéria Laboratório de Criação e Produção Gráfica - uma cadeira do curso de Publicidade do IESB que representa bem a dualidade entre teoria e prática (nota do autor: a propaganda foi involuntária :), já que se trata de uma matéria extremamente pragmática cuja participação depende diretamente de uma série de conceitos abstratos, como processos comunicativos, retórica aristotélica e outros. Hoje, um dos pontos mais críticos que percebo em sala de aula é a construção de uma mensagem primária com viés publicitário. Ou (em português mais claro), saber como fazer um bom título.

A cada novo briefing, uma enxurrada de frases vazias, esdrúxulas, complicadas ou simplesmente sem sentido vem engrossar a lista do que não deve ser feito quando se cria uma peça publicitária. Eis alguns exemplos aterradores (os nomes dos autores foram omitidos para proteger os inocentes):

  • “De onde vêm estes sorrisos? É a nacionalidade do surf.” (para Mormaii Brasília)
  • “Jacaré hoje, jacaré forever.” (para Mormaii Brasília)
  • “Bengala na banguela.” (para Viagra)
  • “Rebola, robalo.” (para Sushi Brasil)
  • “Descoberto o segredo da aranha que picou ele” (para a revista Wizard)
  • “Se chover salva também.” (para pneus Michelin)
  • “É proibida a circulação de veículos equipados com pneus cujo desgaste da banda de rodagem seja inferior a 1,69mm de profundidade” (para pneus Michelin)

... a lista é interminável. Invariavelmente, após quatro meses de labuta, alguns acabam achando o caminho das pedras e entendendo o que dá certo, e por que. Do lado docente, após quatro anos de acompanhamento contínuo, é possível perceber padrões e identificar os problemas mais comuns encontrados nos títulos produzidos:

Títulos que são slogans, não títulos. Segundo o “pai dos burros cibernético” (Wikipedia), “Um slogan ou frase de efeito é uma frase de fácil memorização agregando um valor único à empresa, produto ou serviço, sendo esse valor concreto ou não.” "Slogan" vem de sluagh-ghairm (se pronuncia slogorm), do gaélico-escocês para "grito de guerra". Já o título publicitário busca algo mais pontual, como sintetizar a promessa de um benefício – ou seja, ele ilustra de uma forma interessante e atraente a mensagem principal do anúncio, e com isso tenta trazer o leitor para o resto da peça. O problema com títulos que têm cara de slogan (“Qualidade e segurança”, “Sua vida com mais cor”, “Você pode confiar na gente”) é que além de serem abstratos demais, eles “chegam com cara de quem já está saindo”, não seduzindo o leitor para que continue vendo a peça publicitária.

Títulos que não dizem nada. Esse é auto-explicativo. Um anúncio tem um propósito: vender um produto, serviço ou benefício. Se seu título não diz nada (“Vá até onde você deseja”, “As estradas do mundo têm nome”), sua peça fica vazia.

Títulos que dependem do texto de apoio para sobreviver. Segundo David Ogilvy, "O título é lido 5 vezes mais que o texto.". Pesquisas mostram também que os maiores índices de dispersão acontecem entre o título e o texto de apoio. Ou seja, delegar para este último a responsabilidade de prender o leitor num cenário em que muitas vezes ele não passará do título é contar demais com a sorte.

Títulos que são foto-legenda. A imagem está lá, dizendo tudo, e o título repete a mesma mensagem só para ter certeza. São como aqueles camaradas que contam uma piada ruim, e quando ninguém ri eles resolvem continuar ofendendo pressupondo que ninguém nriu porque não entenderam a sacada genial – e aí eles explicam (“sacou? sacou?”). Há vários exemplos clássicos. Um dos últimos que vi trazia o titulo “o mundo é bárbaro” acompanhando de um globo terrestre usando um capacete viking. “O mundo... bárbaro. Hein? Sacou? Sacou?”

Títulos sem correlação com o resto do anúncio. É o caso oposto ao da foto-legenda, e tão comum quanto. O título fala uma coisa, e a imagem diz outra que não tem nada a ver com o título – ou com nada mais, frequentemente. Exemplos disso costumam ser tão bizarros que é até melhor omiti-los.

Títulos mal construídos. A metáfora é boa, o argumento é pertinente, a idéias está lá... Mas o conjunto não funciona. A frase não é fluida, há cacofonia, a mensagem não foi abordada pelo ângulo certo, ou simplesmente está mal construída. Dos problemas, este talvez seja o menor, porque significa que há conteúdo por trás do trabalho, e logo há salvação. E esta salvação não é outra senão aprender pelos bons exemplos: ler, ler, ler, ler, ler, ler... E escrever. Muito. Incansavelmente. Segundo Carlos Domingos (autor de “Criação Sem Pistolão”), “A menos que você seja repentista, vai ter que fazer muitos títulos até chegar num bom. Eu só conheço este jeito de fazer bons títulos: fazer muitos. Quando digo muitos, quero dizer 50, 100, 200... até chegar lá e acertar. O melhor método de trabalho que existe é o darwiniano: ter muitas idéias, mas só as melhores sobrevivem."

Fim da Parte I...

segunda-feira, 25 de agosto de 2008

a soma de todas as partes

Dizem (e esta é uma piada que possivelmente só fará sentido para quem tem mais de 35 anos) que a diferença entre Steve Austin e Frankenstein é que este último foi operado pelo SUS (ha ha ha ok, não teve graça).

Idiossincrasias à parte, a comparação traz à tona a importância não apenas de se ter boas partes, mas de como elas são integradas. Criação publicitária não tem fórmula pronta (embora tenha métodos), e em sala de aula constantemente vê-se como isso confunde a cabeça de quem está começando a explorar esse ofício. Didaticamente, sempre se ressalta a importância do processo (definir bem o problema, abastecer-se de informação, trabalhar exaustivamente o texto buscando formas diferentes de dizer a mesma coisa, etc.) mas o fato é que (e esse possivelmente é o pilar das dúvidas) de nada adiante fazer isso tudo bem se o resultado final não funcionar. Parece aqueles processos (comuns a quem já trabalho em TI) nos quais tudo tem prioridade um. Ou seja, you gotta walk the walk - mas o que vale mesmo, de verdade, é uma solução final que funcione.

E para que ela funcione, é preciso que a soma das partes funcione.

O que nos leva ao próximo ponto (uma situação extremamente comum em sala de aula), que são peças criadas via checklist, ao invés de pensadas como um todo. Aí está lá o cidadão criando e tendo em mente que o público-alvo é masculino, classe A, acima de 30 anos. Então ele coloca uma mulher de biquini (porque é masculino), um carrão esportivo luxo (porque é classe A) e alguma referência aos anos 80 (porque é acima de 30 anos). E esquece que além desses três elementos não conversarem entre si, o anúncio é de capuccino.

Aí bate a preocupação e ele resolve consertar tudo no texto de apoio (doravante chamado de texto-muleta). O problema é que 80% da venda recaem sobre o título/imagem, e que o maior índice de dispersão ocorre exatamente entre o título e o primeiro parágrafo do texto de apoio.

E ele acaba com um belo anúncio com uma gostosona num carro luxo esportivo, dirigido pelo Fofão ou pelo RPM, com um título de três linhas seguido de um texto com quatro parágrafos... que será veiculado num front-light cujo tempo de visualização será - de muito bom grado - cerca de 5 segundos.

Não é à toa que vários dos livros que abordam criatividade e processo criativo dão tanta ênfase às etapas de identificação do problema e de preparação. Em minha época de faculdade, comentava-se que no Japão gasta-se 4 anos projetando um edifício, que leva 3 meses para ser erguido e dura anos, enquanto no Brasil projeta-se por 3 meses, gasta-se quatro anos construindo e nunca se sabe qunto tempo ele ficará de pé. Para qualquer processo de criação, pensar exaustivamente e buscar todos os ângulos possíveis do problema é essencial, porque você pode descobrir 50 fatores que não atrapalham a interpretação de seu anúncio, mas basta apenas um que o faça para comprometer o resultado final.

Por isso criar é antes de tudo fazer perguntas, muitas perguntas. Quem é meu público? Onde ele consome meu produto/serviço? Em que situação ele estará exposto à peça que criei? O que concorre com a atenção dele? Quais as motivações reais? Quem toma a decisão de compra? Quais são os pontos fortes e fracos da mídia que estou usando? Que tipo de narrativa se adequa melhor a ela?... E por aí vai.

Uma dessas historinhas míticas que sempre vêm à tona quando se fala de grandes artistas conta que Michelângelo, quando perguntado sobre seu método para esculpir um belo leão a partir de um bloco inerte de pedra, respondeu assim: "É fácil. Eu olho para a pedra, e tiro dela tudo o que não é o leão. O que sobrar, é o leão". Criar, às vezes, é isso: descobrir o caminho certo eliminando todos os menos certos.

sexta-feira, 1 de agosto de 2008

Indicação: Glenn Jones

Vale a pena dar uma passada no blog do artista gráfico Glenn Jones. Não apenas por seu estilo de desenho pop e divertido, mas por suas abordagens visuais que brincam com analogias e leituras de modo semelhante ao que a criação publicitária faz, explorando as diversas interpretações que uma idéia pode ter.

Gostei particularmente de Extreme Beginnings, Rock Me Amadeus, Prankster e Calling Home, todos bons trocadilhos visuais.

Dica do site Drawn!.

quarta-feira, 30 de julho de 2008

De onde saem as idéias?

Nos sempre estamos cobrando dos alunos as tais de referências. “O bom publicitário é aquele que tem um leque variado de referências”. “Faltam referências no trabalho de vocês”. “As suas referências são óbvias demais”. Ao final das contas, o que isso quer dizer? Que referências são essas, e onde posso encontrá-las, como posso adquiri-las?

Para começar, podem encontrar algumas respostas à essas perguntas nos nossos posts que trazem sugestões de atividades na cidade e on-line, assim como nas listas de leitura que disponibilizamos a cada semestre. Pois é, as referências estão por perto, e raramente vai ter uma que vale mais do que uma outra (eu odeio funk carioca com uma paixão incomensurável, mas não tenho como negar que é um fenômeno marcante da cultura desse país. Se eu me obstino a ignorar isso, estou me fechando para um público enorme, para uma realidade compartilhada por muitos). Adquirir referências pode ser uma coisas tanto passiva – ter que aguentar um funk contra a sua vontade numa festa – como ativa – surfar blogs de design ou rever pela 24a vez o seu Hitchcock preferido. O ponto de partida é a curiosidade, a vontade de aprender a conhecer, não apenas no sentido acadêmico, mas simplesmente pelo prazer de observar, descobrir uma novidade, perceber o anodino e ver que ele está conectado a um mundo de outras coisas. Ter referências não é nada mais do que conhecer o mundo que te cerca. Easier said than done - é coisa de mais para aprender e lembrar! Vamos ver.

Eu vou tentar acrescentar às dicas aqui postadas, e até dar um passo para trás e qualificá-las, para que vocês possam saber reconhecer uma referência quando ela passa por perto. Como eu sei que os alunos, muitas vezes, estão atrás de dicas objetivas, passos enumerados que, seguidos de acordo com as instruções, levarão à genialidade, vou aproveitar e formular as minhas dicas para ajudar vocês de forma muito pragmática, e passar para vocês, literalmente, um exercício para adquirir referências.

A primeira coisa que é importante realçar, é que, de fato, têm diferentes tipos de referências que vocês podem adquirir de diferentes formas (isso não diz respeito ao “valor” das referências; vide acima). Todos devem ter um mínimo de cultura erudita, essa que é associada às mais nobres formas de arte (literatura, belas artes, música), mas também à cultura geral. Conhecer a história não apenas do seu país como também do mundo, ter umas noções básicas de ciências, política, filosofia, etc, são coisas essenciais e importantes para ser um cidadão funcional capaz de atuar de forma construtiva na sociedade. São os tipos de conhecimentos que a gente adquire principalmente na escola e na faculdade – e quando não estamos mais na faculdade, lendo, lendo e lendo de tudo (revista, jornal, livro gráfico, embalagem de shampoo, blog, site de notícias, romance – até os do Jô Soares), indo para o cinema (os últimos anos foram ótimos para ficções baseadas em fatos reais nas telonas: Blood Diamonds, Good Night, Good Luck, O Ano que os Meus Pais Saírem de Férias, The Constant Gardner, U93, The Aviator, No Country For Old Men, The Last Emperor of Scotland, etc.), indo para museus e exposições (são mais de 30 museus em Brasília, com todo tipo de coleção - e praticamente todos eles são de graça) e assistindo o seu canal de notícias favorito. Esse acréscimo de dados, fatos e conhecimentos continua a vida toda (ainda bem – já pensou se com 22 anos se parava de aprender?) e é essencial para contextualizar o seu trabalho, que sempre vai se encaixar dentro de uma série de circunstâncias sociais particulares. Esse só pode ter ressonância e impacto se ele fale de coisas profundas, não esotéricas, mas sim fenômenos marcantes, por serem reais, relevantes e compartilhados pela nossa sociedade numa larga escala. São esses fenômenos que nos unem, e que fazem com quem nós (vocês) se sintam brasileiros - pensem no impeachement do Collor, na primeira ovelha clonada, nos anos de Chumbo, no primeiro homem na lua, na semana de 22, na chegada da TV a cabo no Brasil, na inflação a 2677%, e por aí vai. Vocês fazem parte disso tudo, e seus públicos também - tem que conhecer!

Tem também um outro tipo de referência, que é tão importante quanto essa primeira para o publicitário. É toda a cultura que é chamada às vezes de low-brow, baixa, em oposição a cultura erudita. O que se faz nas ruas? Como é o cotidiano das pessoas? O que motiva elas? O sociólogo Raymond Williams descrevia a cultura como sendo uma coisa ordinária, banal, esse conjunto de manifestações que liga pessoas de um mesmo grupo, que faz parte da identidade delas. Sim, tem a história, como acabei de mencionar. Mas existem manifestações mais espontâneas e informais que não acontecem nos museus nem nas salas de teatro. Essas costumam ser mais intensas, mais segmentadas, mais efémeras (pense nos emos ou no glam rock) do que aqueles grandes movimentos sociais discutidos na salas das faculdades, mas não necessariamente menos significativas. Beleza, mas como captar esse tipo de fenômeno, como achá-lo e interpretá-lo? A resposta é simples. Você deve mergulhar no cotidiano, se tornar um especialista das pessoas comuns, da vida da rua. Não tem jeito melhor para fazer isso do que chamar o seu Baudelaire interior e se assumir como um flâneur, aquele que fica passeando (flâner, em francês), sem objetivo específico a não ser curtir o visual e observar as pessoas. O flâneur é um observador apaixonado que não permanece indiferente, mas que consegue fazer parte de, e ao mesmo tempo, ser a parte da realidade que ele observe. Ele é auto-consciente, e toma uma atitude relativa às cenas que ele presencia. Ele é “um botanista das calçadas”. (Será que essas coisas são possíveis em Brasília onde as pessoas não andam e nem tem calçada? E aí, vocês amantes da cidade, aguardo vocês para me responder...)

É importante encarar isso não como uma tarefa de casa chata, e sim como uma coisa prazerosa. Não limita as suas experiências e pesquisas a assuntos diretamente ligados aos seu projetos atuais. Aproveita cada trabalho como uma oportunidade para aprender mais, conhecer o mundo, pois é isso que vai te fazer crescer como profissional, mas também como ser humano.

quinta-feira, 29 de maio de 2008

Indicação: Illustration Class

Numa área em que disputas de ego dominam e profissionais frequentemente guardam segredos técnicos com unhas e dentes, a generosidade de Von. R. Glitschka é mais do que bem vinda.

Ilustrador e designer com ampla experiência em identidade visual e desenvolvimento de personagens, Mr. Glitschka criou um blog - o IllustrationClass.com - no qual divide com os interessados na área seus segredos de criação e produção de ilustrações para fins variados.

Mais do que isso - ele disponibiliza tutoriais de seus trabalhos, com passo-a-passo de criação de logos e posters. E ainda convida outros ilustradores a compartilhar suas experiências.

A cereja do bolo são os doodles e outros exercícios para estimular a criatividade visual. Tudo com uma cara simpática, viva e colorida - exatamente como os desenhos de Glitschka. Parabéns pela iniciativa!

segunda-feira, 19 de maio de 2008

Criação-com-fritas

Publicidade e propaganda deixaram há tempos de ser assunto restrito a profissionais da área. Cada vez mais o tema surge nas conversas de bar, no trabalho, em casa. E o número crescente de alunos que buscam a cada semestre cursos na esperança de se tornarem os novos Duailibis, Olivettos e Nizans comprova essa teoria.

E como acontece com qualquer assunto que permaneça muito tempo na berlinda, acaba virando algo do qual muito se fala mas pouco se sabe realmente. Some a isto todo o buzzware da área (o hábito de criar a todo momento novas expressões de utilidade discutível já foi ironizado até pelo próprio mercado publicitário) e está armado o grande e caótico circo da criação publicitária.

Esse falatório todo afeta inclusive quem está chegando agora ao mercado e às faculdades. Em sala de aula, frequentemente se vê gente perdida, tentando encontrar o caminho das pedras entre tantas regras e checklists do que fazer para criar bem (questão aliás que já foi abordada neste blog). E por dar aulas num semestre no qual esses processos são cruciais para o bom desempenho dos alunos (Laboratório de Criação para Mídia Impressa), minha atenção está sempre voltada para exemplos e metáforas que facilitem essa compreensão.

Num desses passeios de site em site esbarrei numa declaração do Eugênio Mohallen que acendeu uma daquelas clássicas e manjadíssimas lâmpadas sobre minha cabeça, apontando um caminho para entender como essas coisas funcionam. Reproduzo aqui a tal declaração:

"O que é propaganda? É tentar disfarçar uma coisa muito chata que é o processo de venda. Tanto que estereótipo disso é aquele vendedor de enciclopédia, que bate na porta e você não quer atender. Propaganda é dar uma disfarçada nisso, é um processo de sedução. Você tem que dizer alguma coisa de maneira interessante, de um jeito novo, fora do lugar-comum. Quanto mais referência tiver de tudo - livro, cinema, música, etc - você terá mais condição e instrumentos para isso. Uma coisa que acho fundamental é observar o ser humano e a você mesmo." (Eugênio Mohallem)

Se eu tivesse que escolher uma lição que resumisse tudo o que um aluno precisa saber para poder começar a criar em publicidade, seria esta declaração do Mohallen. Está tudo ali:

"O que é propaganda? É tentar disfarçar uma coisa muito chata que é o processo de venda. Tanto que estereótipo disso é aquele vendedor de enciclopédia, que bate na porta e você não quer atender." Aqui cabe deixar claro que (como bem disse o Casulo num post anterior) "vendedor" aqui não é uma comparação literal. Nosso processo de venda funciona para ambos os lados: ao mesmo tempo temos que transmitir para o público informações de forma otimizada e estimular o cliente a se envolver nesse processo, aceitando desafios e procurando soluções que façam diferença e saiam da mesmice.

"Propaganda é dar uma disfarçada nisso, é um processo de sedução. Você tem que dizer alguma coisa de maneira interessante, de um jeito novo, fora do lugar-comum". Fale, mas fale diferente, como já dizia o personagem da Escolinha do professor Raimundo. A busca por uma mensagem não apenas relevante mas também interessante e de impacto não é apenas um capricho das duplas de criação ou um maneirismo dos publicitários. Não se trata de querer ser engraçadinho (embora o mercado esteja cheio de profissionais que acham que boa propaganda é aquela recheada de "sacadinhas"). Trata-se de seduzir - e sedução é uma arte que vem desaparecendo em meio a mensagens fáceis e apelativas. Para quem conhece o famosíssimo comercial "1984" da Apple, um bom exemplo dessa tendência pode ser visto neste vídeo aqui.

"Quanto mais referência tiver de tudo - livro, cinema, música, etc - você terá mais condição e instrumentos para isso. Uma coisa que acho fundamental é observar o ser humano e a você mesmo". Aqui Eugênio Mohallem finaliza com chave de ouro, deixando claro o quão importante é ter conteúdo para criar boas associações. Ninguém espera que um ciclista esteja pronto para disputar a Tour de France sentado num sofá em casa mentalizando sua bicicleta, mas por alguma razão que me foge à compreensão, ainda há quem ache que para criar não é preciso ler ou escrever.

Cada vez mais fica claro que criar é algo que deve ser mais aprendido que ensinado. Mas enquanto não surge o tal método mágico de ensino, é bom poder desfrutar da sabedoria escondida nessas pequenas pílulas que os grandes profissionais nos dão de vez em quando.

sexta-feira, 16 de maio de 2008

Na hora H, transpirar é melhor do que Viagra

Criatividade é uma expressão que gera tantas crises de identidade. Crise nos que se entitulam criativos. Crise nos que acham que jamais chegarão a ter um espasmo iluminado. Crise nos palpiteiros de plantão. Crise por onde quer que ela passe. Isso é muito estranho, pois todo discurso moderno vindo de empreendedores, de marketeiros, de pessoas envolvidas com processos decisórios fazem referência a tal criatividade como um acessório de série (e não opcional) em qualquer indivíduo capaz de bolar soluções que, para muitos “engenheiros de obras prontas”, não passam de coisas óbvias.

O que é criatividade nos dias de hoje? A criatividade de hoje é diferente da criatividade de ontem? É mais difícil ser uma pessoa criativa no mundo globalizado em que vivemos do que há décadas atrás? São tantas as perguntas que acabo entendendo o porquê das incontáveis crises.

O cerne da questão está na falta de entendimento do que realmente explica conceitualmente a tal criatividade. Diferente do que a maioria dos mortais pensa, criatividade não significa inovar sempre. Inovar possui uma relação bastante íntima com o conceito de criatividade, mas não é condição de existência da mesma. Jamais podemos esquecer que a procura pela inovação é quase uma imposição do mercado. Ainda mais quando estamos nos referindo ao cruel e nada compreensivo mercado publicitário. O difícil é fazer com que a relação que existe entre agência de publicidade e clientes seja amistosa, quando existe a falta de diálogo numa mesma freqüência. Os clientes, geralmente, querem inovar, quando, na verdade, não permitem que os comunicólogos (no caso, os publicitários) decodifiquem seus anseios através de um discurso publicitário pleno. É como se você chegasse em Paris, por exemplo, soubesse que quer comer uma baguete, mas não soubesse como pedir. Essa sensação é extremamente broxante. Se coloque no lugar do cliente e imagine o quanto é ruim sentir que falhou na hora “H”. Agora imagine que você é o cara mais criativo de uma agência de publicidade, seja na área de atendimento, mídia ou criação, mas não conseguiu estimular seu cliente suficientemente, a ponto dele se sentir impotente. Ruim essa relação, não é? Como sabemos que viagra não resolve este impasse, cabe a nós publicitários fazermos um minucioso trabalho de educação publicitária a todos que exigem criatividade até na hora de bolarmos um mega ultra cartão de visitas. Se for entendimento comum, que criatividade é a arte de solucionar problemas, ora inovando, ora não, a relação entre cliente e publicitários será mais amena e respeitosa. Publicidade significa tornar algo público. Não somos vendedores, como pensam.

terça-feira, 29 de abril de 2008

A inspiração do texto

Algumas pessoas acham que as idéias brotam do nada ou de uma certa "inspiração divina". Isso não existe! Se o cara não transpira, não rala muito, fica muito difícil ter um lampejo. Eu me lembro daquela frase do Ortega y Gasset que dizia: "eu sou eu e minhas circunstâncias". Somos, de fato, uma soma das nossas experiências, valores e ideologias. Ou seja: enquanto não houver pesquisa, as peças não vão "acontecer". Tudo isso, é claro, impulsionado por um desejo muito grande de experimentar e, quem sabe, acertar. Tenho saudade de alguns alunos. Aqueles que eu percebia no brilho dos olhos a descoberta do texto genial. Alguns têm um certo dom. Esses caras (e moças!) já nasceram com o bichinho do texto. Outros são ávidos pesquisadores e têm, ainda, uma privilegiada agilidade mental. Quando essas características se juntam em um cara só, sai de baixo. Daí surgem os redatores, poetas, romancistas etc. Escrever não é difícil. Difícil mesmo é tocar o outro. Seduzir e se deixar seduzir pelo prazer do texto. Tudo bem que estamos vivendo na era das imagens. A fotografia muito me inebria. Mas a palavra certa, no tom exato, ao pé do ouvido,muitas vezes... é infalível.

segunda-feira, 28 de abril de 2008

Quid Spermatum Alec Est?*

(* ou em bom português: "que porra é esta?")

"A criação, em propaganda, é um ato simples, banal, intelectualmente primário" (Roberto Menna Barreto)


"Criação não é fácil, não é rápido, não é divertido, não é para qualquer um" (Pedro Victor)


"Criar é um ato divino" (João do Rio)


"Propaganda é uma merda. Propaganda serve, sabe pra que? Para se ganhar dinheiro mais fácil. Para se ter tempo." (Orígenes Lessa)


Ilustração by Claudio Delamare © 2007A lista de declarações poderia continuar ad infinitum, ora afirmando, ora contradizendo alguma premissa básica do que as pessoas imaginam ser a criação publicitária.

E essa diversidade de visões causa mesmo confusão em quem não é da área. Na verdade, muitas vezes confunde quem é da área - ou planeja entrar nela.

Para mim, isso tudo tem muito a ver com algorítimos e heurísticas.

Pausa para um pequeno interlúdio. Sem ofender inteligência de ninguém, mas para dar clareza a meu ponto, pode-se entender algorítimos como "regras/leis/verdades que sempre que aplicadas a premissas conhecidas produzem resultados, se não conhecidos, pelo menos esperados"; e heurísticas (do grego Heurisken, “descobrir”) como "uma verdade circunstancial, não verificável, não matematicamente comprovável".

As heurísticas são comprováveis por tentativa e erro, ou conforme Thorndike, por "seleção" e "mudança associativa". Por não produzirem sempre os mesmo resultados, as heurísticas admitem contradições. Por exemplo: as verdades dos provérbios. Pode-se dizer tanto "Deus ajuda a quem cedo madruga" quanto "mais vale a quem Deus ajuda do que quem cedo madruga".

De volta à lucubração.

Regras? Há aos montes. Todos os dias, em sala, dou toques sobre por onde ir, por onde não ir, que tipos de construções visuais ou verbais são boas ou ruins, como criar boas comparações. E sempre há canetas e lápises hávidos, rabiscado cada dica, regra ou instrução. E tentam processar e sistematizar essas regras todas, na esperança de conseguir o método perfeito.

Mas o processo de entender isso não é fácil, e se há uma regra para se aprender é a de que em criação não há receita de bolo.

Roberto Duailibi, no seu Propaganda e Marketing (escrito a quatro mãos com Harry Simonsen Jr), diz que criatividade tem mais a ver com heurísticas que com algorítimos. A Criatividade é um processo mais heurístico que algorítmico porque lida com dados que não são precisos e acertivos. Não se pode ter certeza de qualquer conclusão a partir de experiências anteriores.

Por isso vale mais a tentativa e erro, vale mais estudar casos e ir descobrindo caminhos por onde as coisas tendem a dar mais certo. Ou seja, construir seu próprio método, seu próprio conhecimento do que funciona e do que não funciona.

E o que este blog tem a ver com isso tudo? Muita coisa, esperamos. A idéia é transformar isso aqui num desfile de idéias inspiradoras, referências culturais e (mais que tudo) fomento ao questionamento. Porque para começar a entender do que se trata criação publicitária, é mais importante fazer boas perguntas que ter respostas prontas.

Entre e aproveite o Criação-Fu - The Ultimate Blackbelt Guide para quem quer criar.

Ippon!