segunda-feira, 25 de agosto de 2008

a soma de todas as partes

Dizem (e esta é uma piada que possivelmente só fará sentido para quem tem mais de 35 anos) que a diferença entre Steve Austin e Frankenstein é que este último foi operado pelo SUS (ha ha ha ok, não teve graça).

Idiossincrasias à parte, a comparação traz à tona a importância não apenas de se ter boas partes, mas de como elas são integradas. Criação publicitária não tem fórmula pronta (embora tenha métodos), e em sala de aula constantemente vê-se como isso confunde a cabeça de quem está começando a explorar esse ofício. Didaticamente, sempre se ressalta a importância do processo (definir bem o problema, abastecer-se de informação, trabalhar exaustivamente o texto buscando formas diferentes de dizer a mesma coisa, etc.) mas o fato é que (e esse possivelmente é o pilar das dúvidas) de nada adiante fazer isso tudo bem se o resultado final não funcionar. Parece aqueles processos (comuns a quem já trabalho em TI) nos quais tudo tem prioridade um. Ou seja, you gotta walk the walk - mas o que vale mesmo, de verdade, é uma solução final que funcione.

E para que ela funcione, é preciso que a soma das partes funcione.

O que nos leva ao próximo ponto (uma situação extremamente comum em sala de aula), que são peças criadas via checklist, ao invés de pensadas como um todo. Aí está lá o cidadão criando e tendo em mente que o público-alvo é masculino, classe A, acima de 30 anos. Então ele coloca uma mulher de biquini (porque é masculino), um carrão esportivo luxo (porque é classe A) e alguma referência aos anos 80 (porque é acima de 30 anos). E esquece que além desses três elementos não conversarem entre si, o anúncio é de capuccino.

Aí bate a preocupação e ele resolve consertar tudo no texto de apoio (doravante chamado de texto-muleta). O problema é que 80% da venda recaem sobre o título/imagem, e que o maior índice de dispersão ocorre exatamente entre o título e o primeiro parágrafo do texto de apoio.

E ele acaba com um belo anúncio com uma gostosona num carro luxo esportivo, dirigido pelo Fofão ou pelo RPM, com um título de três linhas seguido de um texto com quatro parágrafos... que será veiculado num front-light cujo tempo de visualização será - de muito bom grado - cerca de 5 segundos.

Não é à toa que vários dos livros que abordam criatividade e processo criativo dão tanta ênfase às etapas de identificação do problema e de preparação. Em minha época de faculdade, comentava-se que no Japão gasta-se 4 anos projetando um edifício, que leva 3 meses para ser erguido e dura anos, enquanto no Brasil projeta-se por 3 meses, gasta-se quatro anos construindo e nunca se sabe qunto tempo ele ficará de pé. Para qualquer processo de criação, pensar exaustivamente e buscar todos os ângulos possíveis do problema é essencial, porque você pode descobrir 50 fatores que não atrapalham a interpretação de seu anúncio, mas basta apenas um que o faça para comprometer o resultado final.

Por isso criar é antes de tudo fazer perguntas, muitas perguntas. Quem é meu público? Onde ele consome meu produto/serviço? Em que situação ele estará exposto à peça que criei? O que concorre com a atenção dele? Quais as motivações reais? Quem toma a decisão de compra? Quais são os pontos fortes e fracos da mídia que estou usando? Que tipo de narrativa se adequa melhor a ela?... E por aí vai.

Uma dessas historinhas míticas que sempre vêm à tona quando se fala de grandes artistas conta que Michelângelo, quando perguntado sobre seu método para esculpir um belo leão a partir de um bloco inerte de pedra, respondeu assim: "É fácil. Eu olho para a pedra, e tiro dela tudo o que não é o leão. O que sobrar, é o leão". Criar, às vezes, é isso: descobrir o caminho certo eliminando todos os menos certos.

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