terça-feira, 14 de abril de 2009

Coisas que não têm nada a ver com criação publicitária (mas têm tudo a ver com criação publicitária)

Quando minha noiva e eu começamos a pensar na cerimônia do nosso casamento, acabamos optando por organizar e produzir nós mesmos a maior parte do evento. Trabalhando com direção de arte, era ponto de honra cuidar pessoalmente da parte gráfica (convites, etc.), mas a decisão abrangeria um escopo maior, incluindo a decoração, lembranças etc. Resolvemos deixar por conta de terceiros apenas o que seria inviável (como serviços de manobrista) ou trabalhoso demais (como o jantar).

Modéstia às favas, a cerimônia foi deliciosa e todos saíram rasgando elogios. Obviamente, quem organiza eventos sempre tem um olhar mais crítico do que quem participa, e ao final, estávamos comentando sobre alguns problemas: serviço ruim dos garçons, o DJ que se resumiu a colocar um CD que nós mesmos gravamos tocando em loop, etc. Os demais detalhes, por outro lado, tinham gerado uma ótima repercussão: os arranjos florais, os brownies que substituíram os tradicionais bem-casados, os sousplats rústicos, etc.

Pouco a pouco percebemos que, no fim das contas, tudo o que tinha ficado em nossas mãos (amadoras) tinha dado 100% certo, enquanto todos os serviços contratados (profissionais e pagos) tinham dado algum tipo de problema - e em geral, problemas facilmente resolvíveis com um pouco de atenção e cuidado.

Ok. E o que isso tem a ver com o trabalho de publicidade?

Para responder a isso, recorro a algo dito por Richard Monturo (autor do livro “Bric-Pop”) durante o NBC08:

“Você não é interessante se não for interessado”.

Sabe aquela história de “todo mundo quer ir para o céu, mas ninguém quer morrer”? Isso acontece com muita freqüência em Publicidade. Todo semestre eu vejo mais e mais alunos ainda deslumbrados com o so-called “glamour” da publicidade. Mas bastam algumas idéias rejeitadas para que o desânimo comece a aparecer. E atrás dele vêm os inevitáveis comentários sobre como seria bom ser um publicitário de sucesso para só fazer aquilo do qual se gosta.

Bem, para quem pensa assim, tenho más notícias: os caras que hoje tem sucesso não chegaram lá fazendo apenas aquilo de que gostam. E certamente também não passaram a pensar assim quando tiveram sucesso.

Abraçar uma profissão é um pouco como um casamento: “na doença e na saúde, na alegria e na tristeza”. Ninguém gosta de fazer tarefas chatas, rotineiras ou maçantes. Mas elas fazem parte do pacote. As pessoas falam do quão legal é ser um jogador de futebol famoso, mas esquecem que em algum domingo perdido ele poderia querer estar com a família num churrasco, e não jogando a partida que as pessoas do churrasco estão vendo. Estar numa cerimônia de entrega do Colunistas ou ouvir um elogio de uma peça publicada certamente é ótimo, mas tentar encontrar aquele título que simplesmente não vem quando já são 8h da noite de domingo, num fim de semana no qual você virou trabalhando e está estourado é um lado da moeda que poucos lembram – mas fatalmente, todos experimentarão, mais cedo ou mais tarde.

Então você pode pensar em todas as coisas boas, divertidas e interessantes que a profissão de publicitário abrange; mas se suas escolhas forem feitas somente na base do lado bom da profissão, nenhuma profissão será boa o suficiente para você.

Realização tem menos a ver com fazer o que se gosta, e mais com gostar do que se faz.

Pode parece um jogo de palavras, mas é uma mudança de atitude que faz toda a diferença. Gostar do que se faz envolve refere-se a ser apaixonado pelo pacote todo, e enxergar as coisas como oportunidades de fazer as coisas acontecerem. É acordar de manhã entusiasmado com as possibilidades, e não vendo tudo como problemas. Fazer só o que gosta é achar que a vida será feita só de contas da Coca-Cola, Nike e Havaianas (e provavelmente, se essas contas caíssem em suas mãos, acharia problemas e defeitos, também). Gostar do que faz é pegar aquele cliente que não tem cacife nem exposição, e assim mesmo encontrar uma solução legal que atenda ao que ele precisa.

Falando assim, tudo soa um pouco como o velho clichê de encarar o copo pela metade como meio cheio ou meio vazio. Mas clichê ou não, faz toda a diferença para quem quer se realizar fazendo aquilo que sabe fazer melhor. E provavelmente é isso que faz do Nizan, um Guanaes, do Eugênio, um Mohallen e do Washington, um Olivetto.

4 comentários:

Anônimo disse...

Realmente isso faz a diferença para o funcionário que deseja ter sucesso.

Mas isso tb faz um diferença quando se trata da empresa, se ela quiser distorcer esse pensamento e fazer do funcionário um escrava isso é um bom argumento!

Marcos Felipe

Claudio "Number 6" Delamare disse...

Claro. Mas aí já se trata de outra coisa: estabelecer limites. É sempre rpeciso saber o que é negociável e o que é inegociável na sua vida. A coisa de vestir a camisa deve acontecer por você, e não pelos outros. E sempre é necessário estar atento para saber quando é hora de mudar.

Anônimo disse...

Nada mais justo que esses comentários, soou um recém formado e conheci algumas partes desse tal "glamour", mas na verdade, grande parte do tempo estou roendo osso, é necessário mesmo você fazer o que não gosta, lembre-se, toda experiência é válida, e se tratando de profissão, até aquelas tarefas sacais, como varejo, ficha de cadastro, recortar aro de bicicleta... acaba fazendo com que haja um acréscimo profissional, faz com que voê crie mais competências. Bom, escreveria mais, mas tem um varejão aqui me esperando.

Renato disse...

Muito bom, de fato acho que alguns momento em que notei que gostava da minha profissão foi exatamente quando continuava gostando do que fazia nos momentos ruins. Essa diferença fica muito mais clara do que quando as coisas são fáceis.

Sobre carreira, um dos problemas é realmente esse que as pessoas vêem uma carreira como uma fotografia instantânea e não como o decorrer de um processo. E ficam indignadas quando não são um sucesso já na segunda semana de trabalho.