quarta-feira, 30 de julho de 2008

De onde saem as idéias?

Nos sempre estamos cobrando dos alunos as tais de referências. “O bom publicitário é aquele que tem um leque variado de referências”. “Faltam referências no trabalho de vocês”. “As suas referências são óbvias demais”. Ao final das contas, o que isso quer dizer? Que referências são essas, e onde posso encontrá-las, como posso adquiri-las?

Para começar, podem encontrar algumas respostas à essas perguntas nos nossos posts que trazem sugestões de atividades na cidade e on-line, assim como nas listas de leitura que disponibilizamos a cada semestre. Pois é, as referências estão por perto, e raramente vai ter uma que vale mais do que uma outra (eu odeio funk carioca com uma paixão incomensurável, mas não tenho como negar que é um fenômeno marcante da cultura desse país. Se eu me obstino a ignorar isso, estou me fechando para um público enorme, para uma realidade compartilhada por muitos). Adquirir referências pode ser uma coisas tanto passiva – ter que aguentar um funk contra a sua vontade numa festa – como ativa – surfar blogs de design ou rever pela 24a vez o seu Hitchcock preferido. O ponto de partida é a curiosidade, a vontade de aprender a conhecer, não apenas no sentido acadêmico, mas simplesmente pelo prazer de observar, descobrir uma novidade, perceber o anodino e ver que ele está conectado a um mundo de outras coisas. Ter referências não é nada mais do que conhecer o mundo que te cerca. Easier said than done - é coisa de mais para aprender e lembrar! Vamos ver.

Eu vou tentar acrescentar às dicas aqui postadas, e até dar um passo para trás e qualificá-las, para que vocês possam saber reconhecer uma referência quando ela passa por perto. Como eu sei que os alunos, muitas vezes, estão atrás de dicas objetivas, passos enumerados que, seguidos de acordo com as instruções, levarão à genialidade, vou aproveitar e formular as minhas dicas para ajudar vocês de forma muito pragmática, e passar para vocês, literalmente, um exercício para adquirir referências.

A primeira coisa que é importante realçar, é que, de fato, têm diferentes tipos de referências que vocês podem adquirir de diferentes formas (isso não diz respeito ao “valor” das referências; vide acima). Todos devem ter um mínimo de cultura erudita, essa que é associada às mais nobres formas de arte (literatura, belas artes, música), mas também à cultura geral. Conhecer a história não apenas do seu país como também do mundo, ter umas noções básicas de ciências, política, filosofia, etc, são coisas essenciais e importantes para ser um cidadão funcional capaz de atuar de forma construtiva na sociedade. São os tipos de conhecimentos que a gente adquire principalmente na escola e na faculdade – e quando não estamos mais na faculdade, lendo, lendo e lendo de tudo (revista, jornal, livro gráfico, embalagem de shampoo, blog, site de notícias, romance – até os do Jô Soares), indo para o cinema (os últimos anos foram ótimos para ficções baseadas em fatos reais nas telonas: Blood Diamonds, Good Night, Good Luck, O Ano que os Meus Pais Saírem de Férias, The Constant Gardner, U93, The Aviator, No Country For Old Men, The Last Emperor of Scotland, etc.), indo para museus e exposições (são mais de 30 museus em Brasília, com todo tipo de coleção - e praticamente todos eles são de graça) e assistindo o seu canal de notícias favorito. Esse acréscimo de dados, fatos e conhecimentos continua a vida toda (ainda bem – já pensou se com 22 anos se parava de aprender?) e é essencial para contextualizar o seu trabalho, que sempre vai se encaixar dentro de uma série de circunstâncias sociais particulares. Esse só pode ter ressonância e impacto se ele fale de coisas profundas, não esotéricas, mas sim fenômenos marcantes, por serem reais, relevantes e compartilhados pela nossa sociedade numa larga escala. São esses fenômenos que nos unem, e que fazem com quem nós (vocês) se sintam brasileiros - pensem no impeachement do Collor, na primeira ovelha clonada, nos anos de Chumbo, no primeiro homem na lua, na semana de 22, na chegada da TV a cabo no Brasil, na inflação a 2677%, e por aí vai. Vocês fazem parte disso tudo, e seus públicos também - tem que conhecer!

Tem também um outro tipo de referência, que é tão importante quanto essa primeira para o publicitário. É toda a cultura que é chamada às vezes de low-brow, baixa, em oposição a cultura erudita. O que se faz nas ruas? Como é o cotidiano das pessoas? O que motiva elas? O sociólogo Raymond Williams descrevia a cultura como sendo uma coisa ordinária, banal, esse conjunto de manifestações que liga pessoas de um mesmo grupo, que faz parte da identidade delas. Sim, tem a história, como acabei de mencionar. Mas existem manifestações mais espontâneas e informais que não acontecem nos museus nem nas salas de teatro. Essas costumam ser mais intensas, mais segmentadas, mais efémeras (pense nos emos ou no glam rock) do que aqueles grandes movimentos sociais discutidos na salas das faculdades, mas não necessariamente menos significativas. Beleza, mas como captar esse tipo de fenômeno, como achá-lo e interpretá-lo? A resposta é simples. Você deve mergulhar no cotidiano, se tornar um especialista das pessoas comuns, da vida da rua. Não tem jeito melhor para fazer isso do que chamar o seu Baudelaire interior e se assumir como um flâneur, aquele que fica passeando (flâner, em francês), sem objetivo específico a não ser curtir o visual e observar as pessoas. O flâneur é um observador apaixonado que não permanece indiferente, mas que consegue fazer parte de, e ao mesmo tempo, ser a parte da realidade que ele observe. Ele é auto-consciente, e toma uma atitude relativa às cenas que ele presencia. Ele é “um botanista das calçadas”. (Será que essas coisas são possíveis em Brasília onde as pessoas não andam e nem tem calçada? E aí, vocês amantes da cidade, aguardo vocês para me responder...)

É importante encarar isso não como uma tarefa de casa chata, e sim como uma coisa prazerosa. Não limita as suas experiências e pesquisas a assuntos diretamente ligados aos seu projetos atuais. Aproveita cada trabalho como uma oportunidade para aprender mais, conhecer o mundo, pois é isso que vai te fazer crescer como profissional, mas também como ser humano.

segunda-feira, 28 de julho de 2008

Indicação: "A Folha que Sobrou do Caderno"

Este documentário foi indicação da Luana Wernik, do blog Experimente Design! (citada anteriormente aqui).

Vale a pena assistir. São apenas 30 e poucos minutos nos quais alunos e professores discutem questões importantes do ensino universitário em geral e de design especificamente.

sexta-feira, 11 de julho de 2008

O poder do não

Didaticamente, costuma-se dizer que exemplos negativos acabam invariavelmente se tornando um reforço ao que na verdade você deseja evitar. Existe uma série de explicações para isso. No entanto, eu ainda acredito que em alguns casos, um sinal de "por aqui não" pode trazer mais benefícios que prejuízo.

Com base nisso, trago dois sites que ajudam a perceber como certos descuidos devem ser pró-ativamente evitados. São detalhes que a experiência ajuda a evitar naturalmente - mas até lá não custa manter-se atento a eles.

O primeiro é o Photoshop Disasters, que traz uma coleção de bizarrices oriundas das famosas "photoshopadas" que vivem sendo feitas em agências e estúdios. Esse tipo de falha grosseira têm se tornado muito frequênte graças à extrema dependência criada em torno dos softwares e ao péssimo vício de resolver imagens em pós-produção.

Uma cena extremamente comum em sala de aula, por exemplo, é vermos tentativas de resolver imagens simples (como um post-it colado em uma das páginas de uma agenda) totalmente em pós-produção, criando camadas e sombras falsas para retângulos pintados, ao invés de simplesmente colar o post-it na agenda e fotografá-lo. (a propósito: post-its colados em páginas de agenda são clichês batidíssimos; não os use nem em pré-produção.)

O outro exemplo é mais sutil porém não menos comum, e está bem exemplificado no "Blog" of "Unnecessary" Quotation Marks.

Em tempos de internet (e não, eu não vou entrar nesse mérito porque é uma longa discussão, mas inevitavelmente também um fato), fica a impressão que o domínio das ferramentas de construção de texto diminui a cada dia. Os vícios vão desde nunca usar menos de três ou quatro pontos de exclamação/interrogação e reticências com quantidades aleatórias de pontos (certa vez uma aluna abriu uma cara de espanto quando expliquei que reticências são sempre três - "como assim? não é de acordo com a intensidade?") até detalhes mais sutis como mal uso de crases, construção de perguntas como se fossem afirmações ou o uso desnecessário de aspas, como no site citado.

Estes são apenas dois exemplos de descuidos que frequentemente matam peças de comunicação. Obviamente tentar decorá-los todos é uma guerra perdida. Para se obter qualidade, o ideal ainda é absorver os métodos e torná-los cada vez mais intuitivos. E, é claro, conhecer seus recursos primordiais de trabalho - seu idioma e sua capacidade de abstração visual. É escolher entre isso ou ser um fazedor de peças patinando na mediocridade.